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[ os pedidos prévios ]

Jamais exigi que entendesses as pequenas brechas que propositalmente – e não raras vezes – eclodiam em meus pequenos devaneios ao café da manhã – sempre abraçados pelas paredes – enquanto, com pressa, te arrumavas para ir ao trabalho.

Em nenhum momento fiz menção ao vazio que sentia quando, à noite, depois da janta e do noticiário, no leito tangenciavas meu sexo sem antes ensaiar um afago, insinuar um beijo, libertar algum murmúrio que indicasse que ali, naquele espaço de nascer e morrer, havia uma linguagem que nos tocava a ambos.

Nunca disse o quanto havia de bucólico e aterrador naquele sol que se esparramava como uma gema furada sobre nossas – o cão estava sempre lá – cabeças quando nos sentávamos sobre a duna para, ao longe, observar, singrando o asfalto quente da tarde, aquela que foi a mais esperada das bicicletas daquela rua.

Hoje, mesmo com os tortos paralelepípedos da minha estrada, as telhas de barro que me cobrem e o morro que me priva do crepúsculo com alguma antecedência, até fritar um ovo me faz chorar.

By Sandro Brincher

Eu sou aquele que, de fones nos ouvidos, através da janela empoeirada do ônibus, perscruta os paralelepípedos irregulares da calçada de um parque à procura de alguém que tenha, ao resgatar do fundo das algibeiras um maço de cigarros molhados pela chuva que acaba de dar trégua, derrubado um bilhete premiado de loteria.

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