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Cotidiano Textos

J. D. Salinger e a inteligência alheia

Hoje é aniversário de J. D. Salinger [1/jan/1919 – 27/jan/2010]​, o mais capricorniano dos escritores. Foi depois de ler seu aclamado romance “O apanhador no campo de centeio” que me dei conta de que eu não era inteligente, era só um cara com meia dúzia de referências e uma boa memória para conhecimento enciclopédico. Era tão pessimista e ranzinza em relação ao mundo quanto o narrador Holden Caufield, mas me sentia meio Sally Hayes:

“Antigamente eu achava a Sally muito inteligente, mas só de burro que eu sou. Só porque ela entendia de teatro, e peças, e literatura e todo esse negócio. Quando as pessoas sabem um bocado sobre essas coisas, a gente leva um tempão para descobrir se são burras ou não. No caso da Sally eu levei anos. Com certeza teria descoberto muito antes, se nós não tivéssemos namorado tanto. O meu problema é que eu sempre acho inteligente a pequena com quem estou me esfregando no momento. Uma coisa não tem droga nenhuma a ver com a outra, mas continuo pensando assim”.

Apesar de que naquela era pré-Google tal habilidade fosse um pouco mais importante, fiquei muito triste, como qualquer adolescente melancólico e de baixa autoestima ficaria. Ao mesmo tempo, aquilo me lançou ótimas perguntas. O que fazer para ser uma pessoa inteligente? Inteligência é dom, é treino ou um pouco dos dois? É realmente importante ser inteligente? As pessoas burras [as realmente burras; não era o caso da Sally Hayes, o narrador exagera um pouco] são mesmo mais felizes?
Nunca consegui responder nenhuma delas. Aliás, rapidamente cheguei à conclusão de que essa era uma empreitada pouco recompensadora. Teve valor, claro, e foi o de me mover em direção a coisas novas, a métodos novos de aprender, mas nunca quis de verdade resolvê-las.
Hoje, ligeiramente mais autoconfiante, mas tristemente mais enciclopédico do que nunca, consigo pelo menos usar essas referências esdrúxulas e aleatórias para fins objetivos. Escrever, por exemplo. As perguntas são outras, mas igualmente insolúveis. Ainda bem.
E vocês, já tiveram essas dúvidas? Já pensaram nisso? Já se sentiram inteligentes ou burros demais em alguma situação? Contem pra mim.

The Catcher in the Rye (1951), by J. D. Salinger.
The Catcher in the Rye (1951), by J. D. Salinger.
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Dicas

15 livros indispensáveis ou 15 dicas sem compromisso

Muita gente me pergunta sobre os livros de que mais gostei ao longo da vida. Pergunta difícil. Há os que li e reli algumas vezes, que cultuo em segredo, mas que eu não indicaria a muita gente. Há os que eu nem curto tanto, mas que considero leitura obrigatória. Há também os que me proporcionaram boas horas de distração e deleite. A lista abaixo é um pouco desses todos. Já sabemos que muitos vão ser esquecidos, mas o importante é saber os que NÃO seriam esquecidos.

livro [autor] país (obs.):

  1. A Máquina Lírica [Herbelto Helder] Portugal (Li no começo da graduação e me impressionou demais. Foi meu contato mais visceral com poesia até hoje)
  2. Avalovara [Osman Lins] Brasil (Na adolescência, eu lia basicamente só Nietzsche, mesmo sem entender muito, e ocultismo; acabei chegando ao Avalovara por conta da forma como foi organizado o romance, baseado num anagrama bem conhecido dos ocultistas)
  3. Crime e Castigo [Dostoiévski] Rússia (Não vou explicar. Leia imediatamente)
  4. Enquanto Agonizo [William Faulkner] EUA (Primeira cena: O filho marceneiro constrói o caixão da mãe moribunda que, de sua cama, observa o trabalho; tenso…)
  5. Judas, o obscuro [Thomas Hardy] Inglaterra (Poucas histórias de personagens são mais deprimentes que a de Judas; a antítese perfeita do “querer é poder”; o 1ª capítulo, entretanto, é muito divertido)
  6. Lavoura Arcaica [Raduan Nassar] Brasil (Violenta e sensual, essa é a linguagem do Nassar; livrinho pequeno, mas avassalador)
  7. Minha mãe morrendo e o menino mentido [Valêncio Xavier] Brasil (romance, poesia, fotonovela, diário, crônica… um livro fisicamente lindo – o da Cia das Letras – e com uma construção única)
  8. O Menino de Areia [Tahar Ben-Jelloun] Marrocos (“Ele se chamará Ahmed, mesmo que seja uma menina”. Começa assim a história de uma mulher que é criada como homem no seio de uma sociedade muçulmana a fim de que o pai, que nunca teve filhos homens, não deixe a herança de sua família aos irmãos)
  9. O vendedor de passados [José Eduardo Agualusa] Angola (O narrador é uma lagartixa e o protagonista é um angolano albino; digo mais?)
  10. O Vermelho e o Negro [Sthendal] França (Não vou explicar. Leia imediatamente)
  11. As laranjas iguais [Oswaldo França Júnior] Brasil (Primeiro e melhor livro de mini-contos que li)
  12. Quo-Vadis [Henryk Sienkiewicz] Polônia (Primeiro romance que li na vida; trata de uma história de amor em meio à perseguição dos cristãos romanos; este livro consolidou aquela lenda de que Nero pôs fogo em Roma para se inspirar nas composições)
  13. Terra Sonâmbula [Mia Couto] Moçambique (Meu segundo contato com literaturas africanas em Português antes da universidade)
  14. Veinte poemas de amor y uma canción desesperada [Pablo Neruda] Chile (Porque cada vez que eu lia isso pensava: cara… ele deve ter apavorado a mulherada).
  15. Vidas Secas [Graciliano Ramos] Brasil (Por causa da Baleia, né? Dããã)